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A mostrar mensagens de 2018

O MAR PASTOR

A S vezes chovia e eu estava longe de casa tinha o mar por pastor. Os outros seguem com os olhos em flecha os dançarinos que vão bailar o medo partem com uma única escova de dentes e um pão por cheirar. Será uma viagem igual a um disfarce de fuso horário ou apenas uma mancha de ferrugem a cresceer em corpo magro de rapariga. Levaram um cheiro de veludo, qualquer pulso livre para estrangular a noite, não fizeram perguntas não quiseram saber de chuva ou gardénias — Mamã quer pouco —, as túnicas ardiam, deixavam de ser eternas havia poucas viagens de sal até aos bosques. A luz nocturna em flecha mordeu-me os pulsos qual rato teórico ou luar do deserto a poisar na roupa esfarrapada. Pó de uvas ou pó das ervas? O leitor não gosta muito de tecedeiras porque há um lume sujo que cresce pelo terror acima logo de manhã no incêndio do mijo. Ou o único beijo feliz não passasse de um insecto tolo. Sem rancor ou peste, às vezes chovia e eu estava long

NATAL FILMADO NO CAMPO

FERNANDO GRADE NATAL FILMADO NO CAMPO à memória de Júlio-António Salgueiro F lauta simples, o Eufrates é o quarto rio, oh menino Cristo que morto ou vivo nunca serás da Babilónia. Mas dizem que vais nascer de novo, necessariamente longe dessas margens lábeis, como todos os anos acontece por esta altura. Vão trazer a música e os enfeites, dois abetos, talvez algumas broas, um aroma de queijo suíço, pequena ovelha feita de barro mal pintado. O Natal porém é diferente de corpo para corpo. O cuspo. Havia um velho que se metia com as raparigas a horas certas, nas pastelarias, no coreto da avenida, na relva que dava para os cisnes pretos. Velho de boca martelada de trapos que dizia ter vivido em muitas guerras. Era esse o seu Natal: sentir que o próprio sexo, réptil, lhe subia aos olhos como no tempo dos bailes, formiga ácida no interior, os dedos. Na gasolina queimada ou por entre o centeio, perde-se o Natal. Há pessoas a quem isso aconteceu há cinco minutos por­que, entretanto

Soneto de Natal

in PEQUENA ANTOLOGIA DE NATAL, 1977